sexta-feira, 13 de junho de 2008

IRLANDESES CHUMBAM TRATADO DE LISBOA EM REFERENDO

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A Irlanda rejeitou em referendo o Tratado de Lisboa, que carece da ratificação de todos os membros da UE para vigorar. Agiganta-se no horizonte dos 27 o fantasma de novo impasse institucional.
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Segundo os resultados definitivos e oficiais, anunciados ao fim da tarde de sexta-feira, o eleitorado da República da Irlanda rejeitou o Tratado de Lisboa com 53,4 por cento dos votos contra 46,6 por cento.
O não venceu em 32 das 43 circunscrições que na quinta-feira acolheram, durante 15 horas, os eleitores irlandeses (perto de três milhões).
A taxa de participação fixou-se em 53,13 por cento, de acordo com os números avançados pelo Governo irlandês.
Para o primeiro-ministro irlandês, na ponte de comando do campo derrotado, os resultados do referendo constituem não só uma “imensa desilusão”, mas também um “potencial revés” para a União Europeia.
“O resultado acarreta consigo uma incerteza considerável e uma situação difícil”, afirmou Brian Cowen pouco depois da divulgação dos resultados finais do escrutínio.
“Não há uma solução rápida”, frisou. “Isto não vai ser resolvido facilmente. Não vamos precipitar-nos para qualquer acção em particular neste momento. Precisamos de parar para observar o que aconteceu e porquê e fazer consultas abrangentes em casa e com os nossos parceiros europeus”.
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Ao início da tarde, as primeiras projecções de resultados do referendo apontavam já para a vitória do não.
Isso mesmo era reconhecido, então, pelo ministro irlandês dos Assuntos Europeus, Dick Rohe, que afirmava em declarações à France Presse que a situação para o campo do sim não parecia “estar muito boa”.
O não, sustentava o governante irlandês, teria encontrado mais adeptos nas regiões rurais e em zonas urbanas operárias, ao passo que o sim teria sido a opção dominante entre a classe média urbana.
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DURÃO BARROSO DEFENDE QUE TRATADO "AINDA ESTÁ VIVO"
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Antecipando-se ao anúncio dos resultados oficiais definitivos do referendo irlandês, o presidente da Comissão Europeia subiu ao púlpito, em Bruxelas, para sustentar que o Tratado de Lisboa “ainda está vivo”, apesar da vitória do não no único referendo realizado no seio da União.



Durão Barroso defendeu que o processo de ratificação deve ser levado até ao fim. “Dezoito [países-membros] já aprovaram [o Tratado de Lisboa]. Um votou contra. Devemos continuar o processo de ratificação e encontrar uma resposta colectiva”, afirmou o presidente da Comissão Europeia.
O presidente do Executivo comunitário frisou, de imediato, que os dirigentes europeus se reúnem na próxima semana em Bruxelas, em Cimeira marcada para os dias 19 e 20 de Junho.
Para Durão Barroso, esse é o melhor ensejo para que os líderes dos 27 se debrucem sobre o real significado do não irlandês.
“O voto pelo não na Irlanda não resolveu os problemas que o Tratado de Lisboa está desenhado para resolver. A Comissão Europeia acredita que as restantes ratificações devem seguir o seu curso”, declarou Durão Barroso.
“Pelo que pude compreender, também pela conversa que mantive com o primeiro-ministro [irlandês Brian] Cowen, também ele acredita que o Tratado não está morto. Eu acredito que o Tratado está vivo e devemos agora encontrar uma solução”, vincou.
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DIRIGENTES EUROPEUS REPERCUTEM DECLARAÇÕES DE DURÃO
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A maior parte dos líderes europeus enveredam por uma posição idêntica à do presidente da Comissão Europeia, do Presidente francês Nicolas Sarkozy e da chanceler alemã Angela Merkel, que optaram por uma reacção conjunta, ao primeiro-ministro esloveno Janez Jansa, cujo país preside actualmente ao Conselho Europeu.
França e Alemanha “lamentam” a vitória do não no referendo da Irlanda e esperam agora que o processo de ratificação prossiga.
“Tomámos conhecimento da decisão democrática dos cidadãos irlandeses com todo o respeito que lhes é devido, apesar de a lamentarmos”, lê-se numa declaração conjunta de franceses e alemães.
“O Tratado de Lisboa foi assinado pelos chefes de Estado ou de governo dos 27 Estados-membros e o processo de ratificação foi já concluído por 18 países. Esperamos por isso que os outros Estados-membros continuem com o processo de ratificação”, acrescenta o documento.
“O primeiro-ministro irlandês informou-nos hoje mesmo do resultado do referendo e fará a sua análise das razões dessa votação no Conselho Europeu de 19 e 20 de Junho. Caberá ao Conselho Europeu tirar as desejáveis conclusões”, referem Paris e Berlim.
Por sua vez, o primeiro-ministro esloveno defendeu o Tratado de Lisboa enquanto instrumento “necessário para tornar a Europa mais eficaz, mais democrática e transparente”.
A presidência eslovena da UE, disse ainda Janez Jansa, “lamenta profundamente o resultado” do escrutínio na Irlanda.
De Londres surge a garantia, pela voz do ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, de que a Grã-Bretanha vai prosseguir na via da ratificação parlamentar do Tratado de Lisboa.
“O Governo irlandês deixou claro que acredita ser correcto que países como a Grã-Bretanha continuem o processo de ratificação, pois há que ter uma perspectiva britânica, bem como uma perspectiva irlandesa”, declarou David Miliband. “Assim, acredito que é correcto continuar com o nosso próprio processo e aceder à oferta irlandesa para mais discussões sobre os próximos passos”, concluiu.
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O QUE ESTÁ EM CAUSA COM O NÃO IRLANDÊS
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Três anos depois do chumbo do anterior Tratado Constitucional nos referendos de França e Holanda, a União Europeia volta a acercar-se da crise com os resultados da consulta popular de quinta-feira na República da Irlanda – o único referendo entre os 27 países-membros, ditado por imperativos constitucionais.
Em causa está agora um Tratado que constituiu, em si mesmo, um plano B para que a UE possa sair do impasse institucional semeado em 2005.
O Tratado de Lisboa, como ficou denominado depois da sua assinatura na capital portuguesa, a 13 de Dezembro de 2007, destina-se a adaptar as instituições da UE a um espaço comunitário alargado a 27 membros e de portas abertas a futuras adesões.
Abandona algumas das disposições mais polémicas que estavam consagradas no Tratado Constitucional.
Porém, recupera muita da substância do extinto projecto constitucional. Não há, por exemplo, quaisquer referências ao termo Constituição ou a símbolos da União Europeia - hino, bandeira ou divisa. É também suprimido o capítulo do Tratado Constitucional sobre o mercado interno.
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Carlos Santos Neves, RTP (extração parcial)

SÓCRATES DESAPONTADO COM VITÓRIA DO NÃO EM REFERENDO
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O primeiro-ministro afirmou esta sexta-feira que a vitória do não no referendo irlandês sobre o Tratado de Lisboa constitui um “profundo desapontamento” para todos os dirigentes europeus e uma "derrota pessoal". José Sócrates recusa a ideia de que o Tratado Reformador da União Europeia esteja “morto” e diz que a Europa deve agora procurar uma solução para o “problema irlandês”.

Numa primeira reacção aos resultados do referendo na República da Irlanda, José Sócrates não escondeu o seu “profundo desapontamento”. Um estado de alma que o primeiro-ministro português diz ser extensível aos seus homólogos europeus. “Isto é naturalmente para todos nós um profundo desapontamento”, declarou o chefe do Governo. "Tenho a certeza de que não apenas para mim, mas para Sarkozy, para Merkel, para Zapatero, para Brown, para Durão Barroso. Todos eles estão neste momento tão desapontados como eu estou".

O primeiro-ministro admitiu mesmo tratar-se de uma "derrota pessoal": "Com certeza é uma derrota pessoal para mim. É uma derrota para mim e para todos aqueles que se empenharam no Tratado de Lisboa e no projecto europeu".

Sócrates fez, depois, a defesa do Tratado assinado a 13 de Dezembro de 2007 em Lisboa enquanto solução para o impasse institucional da União Europeia a 27, apesar do chumbo na consulta popular da Irlanda.

“O Tratado de Lisboa permite enfrentar os problemas que neste momento a Europa tem: uma Europa que precisa de ter uma voz mais forte no Mundo, porque o Tratado de Lisboa não é apenas importante para os europeus, é importante para o Mundo”.

Para o primeiro-ministro português, o Tratado rejeitado pelo eleitorado irlandês “permite uma Europa mais forte, mais actuante nas relações internacionais e capaz de responder aos problemas que a economia europeia enfrenta”.
“A Europa tem de responder, por exemplo, ao desafio dos combustíveis e precisa, para responder a este como a outros, de ter instituições mais bem preparadas para dar uma resposta à altura daquilo que os europeus esperam que a Europa possa dar”, advogou Sócrates.
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Às questões sobre a viabilidade de um Tratado vetado no único referendo realizado no conjunto dos 27, o primeiro-ministro responde com o argumento de que ”o consenso político que foi firmado em Lisboa deve continuar”. “Acho exactamente o contrário. A base política e o consenso político que foram firmados em Lisboa devem continuar.
Devemos arranjar uma solução para responder ao problema irlandês. É assim que eu encaro esta situação”, disse.
Na quinta-feira, durante o debate quinzenal na Assembleia da República, o primeiro-ministro havia afirmado que a sorte do Tratado de Lisboa era "fundamental" para a sua carreira política. "Eu considero que o Tratado de Lisboa foi um dos momentos mais significativos da minha carreira", explicou esta sexta-feira o primeiro-ministro.
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Carlos Santos Neves, RTP
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