sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

“ESTÁ A DAR-ME UMA COISINHA MÁ!” - sorriam, pra variar

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A SELVA DO DESERTO INUNDADO

Lá vão cantando e rindo, sem saber porquê. Subindo a calçada vai Leonor, pela formosura do fresco da noite. Caminha pela sombra porque o sol está quente. Abriga-se à luz do candeeiro apagado e tropeça na folha de papel do orçamento de estado que os deputados, mesmo ali ao lado, tinham deitado fora e metido as notas aos bolsos.

Caminhava Leonor pela formosura apesar de não saber o caminho. Pensou estar atrasada no nada que tinha para fazer. Correu, com pressa de ainda fazer menos. Parou junto ao homem que estava todo nu com uma faca na algibeira e perguntou-lhe as horas. Ele olhou para o bolso e tirou o relógio de cuco, deixando fugir. As horas voam, disse por resposta. Vai atrás delas, que o cuco foi para a praia, prá Costa (da Caparica).

Leonor seguiu, parada que ficou sem os pés mexer. Era entrevada a coitadinha. Tinha nascido de dezoito meses e até trazia barbas na bengala que o avô lhe oferecera quando ainda estava na barriga da mãe.

Parada, seguiu Leonor pela estrada que não era. Nem caminho. O governo só tinha dinheiro para fazer carreiros prás formigas que se portassem bem e fossem afetas ao formigão-rei, que com ele comessem e defecassem, ou isso ou que fizessem outras fajardices quaisquer.

Quem diria, disse Leonor, estão ali malmequeres. Cega, apanhou-os com sofreguidão e logo ali os vomitou porque as pétalas eram de cardos que picavam, muito ásperos e macios, pareciam veludo.

Nisto, surge o grilo, que ladrando afastou o manso leão que virava um caixote do lixo à procura da girafa… para a comer.

Mas que selva, disse para comigo, depois de já estar muito farto de ver tudo aquilo sem conseguir formular uma opinião. Apressadamente chamei um táxi e levantámos voo. Foge!
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